31 de dezembro de 2011

CORA CORALINA
 
 
Um repórter perguntou à Cora Coralina o que é viver bem.
Ela lhe disse:
"Eu não tenho medo dos anos e não penso em velhice. E digo pra você, não pense.
Nunca diga estou envelhecendo, estou ficando velha. Eu não digo. Eu não digo que estou velha, e não digo que estou ouvindo pouco.
É claro que quando preciso de ajuda, eu digo que preciso.

Procuro sempre ler e estar atualizada com os fatos e isso me ajuda a vencer as dificuldades da vida. O melhor roteiro é ler e praticar o que lê. O bom é produzir sempre e não dormir de dia.
Também não diga pra você que está ficando esquecida, porque assim você fica mais.
Nunca digo que estou doente, digo sempre: estou ótima. Eu não digo nunca que estou cansada.

Nada de palavra negativa. Quanto mais você diz estar ficando cansada e esquecida, mais esquecida fica.
Você vai se convencendo daquilo e convence os outros. Então silêncio!
Sei que tenho muitos anos. Sei que venho do século passado, e que trago comigo todas as idades, mas não sei se sou velha, não. Você acha que eu sou?

Posso dizer que eu sou a terra e nada mais quero ser. Filha dessa abençoada terra de Goiás.
Convoco os velhos como eu, ou mais velhos que eu, para exercerem seus direitos.
Sei que alguém vai ter que me enterrar, mas eu não vou fazer isso comigo.

Tenho consciência de ser autêntica e procuro superar todos os dias minha própria personalidade, despedaçando dentro de mim tudo que é velho e morto, pois lutar é a palavra vibrante que levanta os fracos e determina os fortes.

O importante é semear, produzir milhões de sorrisos de solidariedade e amizade.
Procuro semear otimismo e plantar sementes de paz e justiça. Digo o que penso, com esperança.

Penso no que faço, com fé. Faço o que devo fazer, com amor. Eu me esforço para ser cada dia melhor, pois bondade também se aprende.

Mesmo quando tudo parece desabar, cabe a mim decidir entre rir ou chorar, ir ou ficar, desistir ou lutar; porque descobri, no caminho incerto da vida, que o mais importante é o decidir".

(Cora Coralina)

25 de dezembro de 2011

O meu presépio

                                                       - Maria Soave -

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Quando eu era criança, gostava demais de viver este tempo que antecede o Natal. Os dias ficavam mais curtos no tempo do Advento. O sol se anunciava raramente e pálido, e as tardes chegavam abraçadas a um manto de neblina.

O tempo de Advento na Itália vem acompanhado de cheiros únicos, inesquecíveis. São os cheiros das tangerinas e das castanhas que são assadas e vendidas pelas calçadas.

Quando eu era criança, adorava o tempo de Advento. Tempo mágico e especial que antecede o Natal.
No dia do padroeiro da cidade de Milão, 07 de dezembro, em casa, nós crianças preparávamos o presépio com o pai e a mãe.

A minha família é do sul da Itália. Nós não temos a tradição da árvore de Natal, que é uma tradição dos povos do norte da Europa. Nós temos a tradição do presépio. O nosso presépio, ainda hoje, conta lindas histórias. Antes de tudo, é um presépio bem antigo. Quem fez algumas estatuetas e mandou fazer outras foi o meu "tata", o meu avô Salvatore, que hoje teria mais de 100 anos. Ele morreu novo, de febre amarela, voltando da guerra na África em 1940. Todas as estatuetas são de barro, material simples dos pobres da terra do sul da Itália. Terra: elemento fundamental da vida. Cada estatueta tem o rosto dos pobres da terra do sul da Itália.

No nosso presépio tinha os pescadores do nosso mar. No presépio tinha o forno e o poço do pequeno lugarejo onde eu e a mãe nascemos. No presépio havia o castelo com as quatro torres que os árabes construíram no litoral do nosso mar. Lá colocávamos as mulheres agricultoras com os trajes típicos de nossas regiões, os corpos morenos, da cor das oliveiras, queimados pelo sol e com um cantil de água na cabeça.

Muitas eram as crianças em nosso presépio. Havia também o padeiro, o sapateiro, "Mestre Nino e Mestre Orlando", os vizinhos da casa da avó. Na praça do presépio, perto da fonte, com o pai e a mãe nós crianças preparávamos a feira. Havia as bancas das verduras e dos peixes, as bancas com muitos tipos de queijos pendurados e as bancas das carnes.

Numa das casas do presépio, numa casa simples com a porta aberta para a rua, bem igual à casa de nossa avó, nós crianças arrumávamos Maria, José, as cabras, as ovelhas, um burrico e o Menino Jesus.

O pai e a mãe tinham uma história para cada pessoa do presépio. Eu gostava muito de "Mechu Orlando", o mestre padeiro, que fazia grandes pães com azeitonas pretas e sempre os levava para Maria e José envoltos em panos brancos, ainda quentes.

Quando colocava "Mechu Orlando" no presépio, me lembrava do forno de perto da casa da avó, de pão feito em casa, e o sabor das azeitonas pretas e do pão voltava à minha boca.

A cada noite nós, três filhos, nos reuníamos com o pai e a mãe para ouvir e contar histórias do presépio.

Cada um, cada uma de nós cuidava, durante o dia, de algumas personagens do presépio e, à noite, contava como aquela personagem tinha passado o dia. Minha mãe falava de Maria, dos trabalhos domésticos e da luta pela sobrevivência do dia-a-dia.

Meu pai, que antes de ser operário nas fábricas do norte da Itália foi marceneiro restaurador de móveis antigos, era José, falava do desemprego, da migração e das mãos calejadas.

Mauro, meu irmão, cuidava da feira e gritava tentando vender os produtos. Antonella, minha irmã, era muito pequena e representava o Menino Jesus.

A avó contava histórias do tempo em que faltava o pão e as pessoas pobres sem terra, como nossa família, comiam no mesmo prato uma comida ainda hoje para nós sagrada: a "frisella". Tratava-se de um pão duríssimo, molhado na água cristalina do mar, com tomate, azeite de oliva e azeitonas pretas. Era a comida cotidiana dos pobres sem terra. Ainda hoje é o prato que, com alegria, eu chamo de comida.

E assim, fazendo memória das nossas tradições, misturando a nossa vida com a história sagrada, construindo um presépio com o nosso rosto, tendo Maria, José, Jesus e as cabras como vizinhos de casa e de comida, nós crianças esperávamos o Natal.

No presépio eu gostava demais de cuidar dos três magos. Na parte externa eu preparava um caminho de areia e lá colocava os camelos e três viajantes. A cada dia eu mudava os magos de posição, aproximando-os cada vez mais da aldeia. Todas as noites contava histórias sobre os três. Eram de raças diferentes. Um era negro, brilhando como uma noite estrelada sem luar. Trazia no seu camelo contos e cheiros de terras diferentes, como nós, gente do mar, somos acostumados a ver dos pescadores da África, da Grécia, da Albânia que desembarcam nas praias do sul da Itália. São gente irmã, com crenças diferentes e a mesma sede de infinito no olhar

Outro vinha da terra onde nasce o sol. Sabia muitas coisas sobre a lua e as estrelas e era gente de paz.

E o último provavelmente era uma menina, e com ela eu gostava de viajar atrás de estrelas, do sonho de um mundo de irmãos, sem exclusões, um mundo onde Deus se fazia criança e morava no meio da humanidade.

Hoje o meu presépio é o espaço grande do coração. É um presépio feito de muitos caminhos percorridos e de horizontes amplos. Muitas pessoas moram na praça da pequena cidade, muitos rostos, corpos, raças, sonhos...

Continuo, como quando menina, viajando atrás de estrelas, acariciando pessoas e sonhos, construindo, no amor cotidiano, um mundo terno, sem exclusões. Um mundo de Deus-criança...

Conheça outras obras de Maria Soave aqui.     

      

6 de dezembro de 2011



Rodeio de Ego

Não se deixe enganar por essa letrinha com corpinho 1, em
itálico, mostrando meu nome bem pequenininho. É disfarce.
No fundo, meu ego megalomaníaco gostaria que o nome
estivesse em letras garrafais, brilhantes, luminosas, em
Times Square, Nova York, como aliás, fazem alguns
apresentadores de tv nas aberturas de seus próprios
programas, em geral, com seus nomes também no título.
Se não o faço é mais por medo que por humildade, mais
por escrúpulo do que por ética. Eu tenho um ego do
tamanho de um bonde, descendo uma ladeira em
São Francisco, sem freio e cheio de passageiros.
Acredite, é mais fácil montar um touro bravo num
rodeio durante oito segundos do que segurar meu
ego selvagem no momento em que alguém abre
a porteira desavisadamente.
A porteira, aliás, acabou de ser aberta. Estou aqui,
me segurando, me roendo, sangrando, navegando
pela web pra me distrair e não liberar o demônio da
Tazmania por uma bobagem.
O pior é que a alegria da platéia é ver o circo pegar
fogo e o palhaço se f..der. A simples menção de que
estou em ponto de bala para deixar meu ego explodir
faz com que a galera grite 'pula! pula!', 'solta, solta'
e 'conta!conta!".
Sim, porque, assim como a indústria alimentícia e o
marketing não colaboram pra que a gente emagreça,
o povo não ajuda ninguém a ser generoso e humilde.
Queremos sangue. Gostamos de sangue. A cor, o cheiro,
o salgado do sangue nos atrai. Por isso todo mundo
diminui a velocidade pra ver um acidente causando
outros acidentes e muito congestionamento.
O ser humano é carnívoro. Competimos por espaço
há milênios. E agora, competimos também na web.

Competimos, é plural de majestade. Eu compito.
Mesmo que não exista a primeira pessoa do
singular do verbo competir. Dane-se. Eu sei
o que meu ego indomável quer:
re-co-nhe-ci-men-to.
O ego quer ser admirado Quer adjetivos elogiosos e
exclamações de grata surpresa. Quer muitos
clap clap clap, quer ohhhhhhhhh! cheios
de agás, quer beijinhos, cutchie cutchie,
e muito bem.
Aperto na bochecha nenê não quer, nenê
não gosta.
Ego é bebê. É criança, fedelho, pentelho.
Ego é chato, voraz, desagradável.
Inadequado. Mas está lá. Sempre pronto
para clamar por justiça.
Mania de ego inflado é se sentir injustiçado.
Passatempo de ego grande é esmagar
em nome da lei. É clamar pelo correto
quando o razoável resolveria. 
Ego não samba, não tem jogo de cintura.
Ego não dorme, morre de insônia.
Ego não goza, finge prazer com gemidinhos.
Quem tem ego tem problema, ema ema ema.
Por isso peço ajuda, encarecidamente, a
todos os que convivem com este monstro
na coleira que arrasto pela mão, meu ego
alemão, com mossarela italiana, convertido
ao judaísmo, trancafiado num corpo pícnico,
agarrado a um cérebro atento, medroso e
inseguro como uma criança que segura um ursinho.
Minha cabeça, é tudo o que meu ego tem pra brincar.
E por isso, de vez em quando, meu ego pega
meu cérebro e chuta como bola no quintal do
coração e marca um gol de mão,
que deveria ser anulado.
Meu ego e meu cérebro, aliás, vivem em constante
disputa e quem perde a partida, sou eu.
Meu cérebro sobe na balança, o ego mente o peso.
Meu cérebro escreve um post, o ego mede as visitas.
Meu cérebro abre a porta, o ego passa primeiro.
No carro, o cérebro dá a partida, o ego acelera.
No vermelho, o cérebro freia, o ego xinga.

O cérebro quer se encontrar, o ego,se acha.
O cérebro quer um amor, o ego, se masturba.
O cérebro busca a performance, o ego quer a medalha.
O cérebro quer terminar este texto, o ego sopra
palavras.

Não é por mal, é só doença. Doença da
ilusão, de todo ser humano, de querer ser
eternamente amado.
Ser continuamente reconhecido.
Infinitamente aplaudido. Em pé.
E, claro, com transmissão simultanea
para todo o planeta.

Ao vivo.
Um beijo, um browse, um aperto de mouse da Rosana Hermann às 18h01

Rosana Hermann
Nascimento26 de julho de 1957 (54 anos)São Paulo, São Paulo
NacionalidadeBrasil brasileira
CônjugeIsaac Efraim (1992 - atualmente)
Ocupaçãoescritora, roteirista,professora
Rosana Hermann (São Paulo, 26 de julho de 1957) é uma escritora, roteirista e apresentadora brasileira. O último programa que apresentou foi o Atualíssima, ao lado de Leão Lobo, na Bandeirantes; também é colunista de vários blogs, entre eles o seu pessoal, o Querido Leitor.
Desde 2000, Rosana mantém um blog de relativo sucesso, muito famoso por suas constantes atualizações, onde versa sobre sua vida pessoal e seus interesses. Tem como característica a atualização diária da página com temas variados. Em 2008 recebeu o prêmio BOBs Awards concedido pela Deutsche Welle como o melhor Blog de Língua Portuguesa.
É Bacharel em física e mestre em física nuclear pelo Instituto de Física da Universidade de São Paulo e tem curso básico de comunicação pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. Iniciou sua carreira na televisão como redatora na produtora RMC-Editevê, onde foi contratada para produzir um programa para a Rede Bandeirantes de televisão. Trabalha profissionalmente em TV desde 1983, e na Internet, desde 1995.
Entre os anos de 1996 e 1997 Rosana pertenceu à equipe paulista de redatores do Sai de Baixo, junto com Flávio de Souza, Elias Andreato e Laerte Coutinho.
Após sair da Bandeirantes, Rosana passou a trabalhar na Rede Record, onde foi apresentadora do Fala Brasil durante três anos. Foi diretora artística da Rede Mulher de Televisão.
Ao longo de sua carreira, trabalhou no SBT, na rádio Jovem Pan, na Rede Manchete e na Rede Globo, como roteirista. (Domingão do Faustão, Sai de Baixo, etc.)
É co-autora do livro Tudo que a Grande Mente Capta e foi colunista da Revista dos Curiosos e do Jornal da Tarde. Na Internet foi colunista de diversos websites, e criou tantos outros. Entre eles, o blog Querido Leitor.
Em 2005 foi sócia de uma empresa de marketing e mídia chamada Synapsys, onde atuou nas funções de repórter, roteirista e editora de programas.
Em 2008 foi para a Rede Bandeirantes saindo da função de redatora do programa Pânico na TV. Na Band comandou o Atualíssima ao lado de Leão Lobo até que, no final de 2008, o programa foi cancelado; mesmo assim Rosana permaneceria como contratada da Band até 2010. Apresentou o quadro "Ombusmann" no programa "A Noite é uma Criança" comandado por Otávio Mesquita.
Em 2008 , a imprensa paulista publicou que Rosana Hermann teria sido cogitada para fazer parte do programa humorístico CQC.
Em setembro de 2009, assumiu a diretoria de Criação e Produto do R7, portal de internet da Rede Record.
Em fevereiro de 2010 , Rosana tornou-se professora do curso de Roteiro de TV na Faculdade de Comunicação da Fundação Armando Álvares Penteado. Em Junho de 2010 ganhou um perfil de fãs no twitter com o nome de @fans_rosana , ganhando assim reconhecimento das pessoas que admiram seu trabalho no rádio, na TV e na internet.
Em maio de 2011 Rosana lançou um livro pela editora Panda Books, intitulado Um passarinho me contou – Relatos de uma viciada em twitter. O livro é baseado em histórias vividas por ela desde sua entrada na rede social Twitter em Abril de 2007.
Atualmente participa também como blogueira/comentarista do programa NBlogs e colunista de redes sociais do Jornal da Record News ao lado de Heródoto Barbeiro.